
Servi sete drinks e ajeitei o corpo na cadeira para ouvi-los desvendar a morte. O meu, doze anos, sem gelo, os deles não importa, qualquer combustível mais jovem ou mais velho serve, precisam apenas queimar e divagar sobre o “se”: Se ele não fumasse tanto; se não tivesse largado aquela mulher que o servira tanto: se tivesse tido mais atitude quando lesado pelo plano Collor: se pudesse dispor de uma assistência à saúde melhor, (quem dissera mesmo que águas passadas não movem moinhos?). Enganara-se diante daqueles Quixotes. Faziam mover com muita vontade, sem ventos nem hélices, gelo nem fazia diferença, doze anos ou mais jovem, mais velho, pouco importa, moinhos de águas que não repassariam jamais. De algo que fora devolvido ao cosmo por que a matéria já não suportava. Imaginem se tivessem deparado com os tubos que levavam ar para um lugar já morto? Com gráficos indecifráveis, secreções tardias... Melhor o “se” da resistência a própria mortalidade... Onde mesmo deixei minha bebida? Em algum lugar entre “Una Musica Brutal” e “O Que Eu Não Sou”?... Poemas aos quais fui apresentada recentemrnte por uma amiga e naquele momento, tomavam-me o juízo através dos fones de ouvido, juntamente com o pensamento em um livro, cujo autor não me recordo agora (perdoem-me), falava ele sobre as conseqüências da “não morte”, me angustiou a lembrança, não havia a ficção e poesia macabra que Wilde “deu” a Gray nem o cientificismo que Mary Shelley “deu” a Frankenstein. Antes, uma dor insuportável por não se poder morrer. O homem com queimaduras de terceiro grau em noventa por cento do copo, aquele outro que teve o cérebro esfacelado por um tiro de espingarda calibre doze, aquela envenenada com cianureto pelo marido, a criança com leucemia, os anencéfalos, os natimortos... Natimortos!? Nenhum deles teve direito a morte, o autor não concedeu, desinventara a morte física. Quanta dor se não há a morte... (Deixei permear minha alma pelo pensamento na falência absurda, como se já não fora, do nosso sistema de saúde, onde abrigar, aqui, tantos "não mortos"?). Vem a Marisa aos meus ouvidos, estou no seu “Vilarejo” e terceira e última dose, doze anos, sem gelo... (será que tem ar em maior quantidade na varanda?) Mais tarde, refarei aquele antigo sorriso numa prece...
(Imagem Google)